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Anna Franceschini, Gustavo Torres, Pablo Accinelli

YOU MUST TRUST US!

curadoria de Bernardo de Souza

Rio de Janeiro | 09 Junho — 09 Julho 2016

Vista da exposição 'YOU MUST TRUST US!', 2016
Duracción Interna, 2016
Duracción Interna, 2016
Vista da exposição 'YOU MUST TRUST US!', 2016
Duracción Interna, duracción externa, 2016
Duracción Interna, duracción externa, 2016
Vista da exposição 'YOU MUST TRUST US!', 2016
Duracción Interna, 2016
Vista da exposição 'YOU MUST TRUST US!', 2016
30, 2012
Vista da exposição 'YOU MUST TRUST US!', 2016
Before They Break, Before They Die, They Fly!, 2014
Before They Break, Before They Die, They Fly!, 2014
Disco contendo o som de sua própria gravação, 2014
Info +
1/14
Carrello, 2012

Anna Franceschinni

Carrello, 2012

filme de 16 mm transferido para digital, colorido, som
32’03”

Before They Break, Before They Die, They Fly!, 2014

Anna Franceschinni

Before They Break, Before They Die, They Fly!, 2014

filme de 16mm transferido para vídeo HD, colorido, mudo
5' 40''

Splendid’s, 2015

Anna Franceschinni

Splendid’s, 2015

filme de 16mm transferido para vídeo HD, colorido, mudo
2'36''

Duracción Interna, 2016

Pablo Accinelli

Duracción Interna, 2016

vidro, grafite e água
22 × 37 × 48 cm

Duracción Interna, duracción externa, 2016

Duracción Interna, duracción externa, 2016

caneta e lápis sobre papel
38 × 48 cm

Duracción Interna, 2016

Pablo Accinelli

Duracción Interna, 2016

bastão de madeira e carta
medidas variáveis

30, 2012

Gustavo Torres

30, 2012

trinta luvas de latex
4 × 25 × 18 cm

Disco contendo o som de sua própria gravação, 2014

Gustavo Torres

Disco contendo o som de sua própria gravação, 2014

disco de vinil
90 × 55 cm

Extensão (#3), 2014

Gustavo Torres

Extensão (#3), 2014

fio elétrico e tomada
medidas variáveis

Bernardo José de Souza

 

Em minha cápsula modernista, de onde avisto o mar, convivo com um número bastante limitado de objetos e aparelhos cujas funções conheço em detalhe – mesmo porque me são essenciais -, embora sequer possa suspeitar das histórias e do passado que me escondem sob mutismo e austeridade aparentes – mas vale frisar, tão só aparentes. Há algo de misterioso, até mesmo aterrador, eu diria, na vida dessas criaturas domésticas das quais nos cercamos por todos os lados, e que parecem conceder sentido e propósito às nossas rotinas e tropeços diários, mas também às nossas mais recônditas e vergonhosas memórias. Um grau de intimidade umbilical vincula o homem a esses seres inanimados, porém dotados de uma alma secreta, que a eles atribuímos um pouco por orgulho e por desejo próprios, e um tanto devido à familiaridade com suas penosas e estáveis presenças em nossas vidas. Vez que outra, os dispensamos sem qualquer piedade, ou mesmo com profundo pesar, reproduzindo a dinâmica afetiva que adotamos nas relações com amigos, amantes, familiares ou colegas de trabalho.

Entretanto, os objetos parecem investidos de memória, carregando em si uma substância semelhante àquela que nos torna humanos; são receptáculos de desejos, raivas, ansiedades, angustias, pressas, depositários de uma fé maior – embora raras vezes correspondam a nossos anseios animistas. Em dados momentos, chego até mesmo a acreditar que se tornam nossos mais vingativos algozes.

***

Nesta casa de azulejos avermelhados, muitas esquadrias e poucos cômodos, reuni um pequeno grupo de objetos que operam por conta própria, transitam pelo mundo à revelia de suas vontades, e assumem aparência e finalidades diversas daquelas para as quais foram originalmente fabricados. São tratados aqui como obras dotadas de plasticidade, revelando-se parcialmente, e apenas parcialmente, cabe dizer, uma vez que, sempre que observados com atenção – e isto varia de sujeito a sujeito -, ganham contornos próprios, novos passados e propósitos insuspeitados.
Há algo de místico ou misterioso na existência dos objetos; são capazes de ascender à vida, mesmo depois de mortos e esquecidos, como num passe de mágica. Revelam e escondem, a um só tempo, dimensões secretas de suas estranhas presenças no mundo. São reais e virtuais; funcionais, quando instados ao trabalho, e disfuncionais, sempre que postos de lado. Em seu conjunto, em seu arranjo no espaço, entabulam uma conversa que tão-somente podemos intuir, ao lhes atribuir o condão da verbalização silenciosa. Desconfio, às vezes, ao apagar as luzes e me recolher ao sono, que permanecem em vigília constante, sem dormir, a conversar entre si, desfrutando do curto espaço de tempo pelo qual estarão juntos – tudo isso graças à oportunidade que lhes foi garantida por mim, curador desta exposição. Seguem vivos, por vezes furtivamente engastados nas memórias daqueles que com eles conviveram, mesmo que apenas por um lapso, por um instante fortuito capturado na pressa de chegar a algum lugar/lugar algum.

***

Há um lustre de cristal nesta exposição, a tilintar silente, o qual jamais se deixará ver por inteiro, apenas como ilusão; há também uma jarra, esta de vidro bruto, cuja transparência nos autorizaria a enxergar seu conteúdo líquido, mas que, todavia, insiste em ser continente de nada, em existir apenas como exercício provocador de metalinguagem, uma dentro da outra, pois obras de arte e objetos também nos pregam peças – aliás, uma de suas funções quase humanas. O vidro tem essa magia, do atravessamento pela visão, de ser raso e profundo, frágil e denso, natural como a paisagem que vejo de minha janela e artificial como a prótese de um amigo meu.

Mas há também uma corrente de energia que circula invisível pelo organismo desta e de quase todas as casas, ora iluminando, ora existindo, apenas, como tantas outras coisas no mundo que apenas existem, sem delas nos darmos conta.

– Mas como nós, humanos, somos profundamente limitados em nossos cinco sentidos!

– Quantas coisas sucedem no universo prescindindo de nossa prévia e desprezada autorização?

Existem, nesta casa, tecnologias que de nada servem, ou que deixaram de nos servir com o tempo, embora sigam operantes, vivas, atuantes até. Existem, no mundo, sons não audíveis e um sem fim de segredos criptografados – embora não haja código que os possa revelar, pois que existem à margem da nossa percepção, dos nossos saberes sabidos ou não sabidos, e da linguagem, ao menos daquela que fomos capazes de articular. Entre os objetos, há o homem, sempre: como mago, como presença real ou fantasmagórica, como memória, como assujeitado pelos diversos sistemas ou como agente de transformação.

Truques, clacks, vrooooms… Abracadabra, et voilá: folhas ao vento, um novo mundo se descortina por detrás do leque de um baralho. Sorte ou acaso, “aqui estamos nós, turistas de guerra”.*

 

Release

YOU MUST TRUST US! aborda a intimidade de objetos e aparelhos domésticos e sua afinidade enigmática com as pessoas. A curadoria é de Bernardo José de Souza, que cria diálogos entre criaturas inanimadas e nossas rotinas.  A exposição apresenta três artistas de diferentes nacionalidades com esse universo imaginário comum: Anna Franceschini (Pavia, Itália 1979, vive e trabalha em Milão), Gustavo Torres (Rio de Janeiro, 1987, vive e trabalha no Rio) e Pablo Accinelli (Buenos Aires, 1983, vive e trabalha em São Paulo) . Os artistas articulam sobre o homem e sua necessidade como agente de transformação dentro de um cotidiano perdido, acarretando a alusão do readymade a partir do objeto como mistério; são funcionais, quando instados ao trabalho, e disfuncionais, sempre que postos de lado. A mostra percorre uma atmosfera fantasmagórica despontando a relação do indivíduo com o objeto, do objeto com o espaço, e finalmente do indivíduo no espaço com o objeto inserido; há uma teatralidade nessa analogia.  A galeria situada em Botafogo, num casarão antigo que já foi um dia lar de uma família– referência essa que trouxe ao curador o diálogo entre os artistas e obras: há material, memória, ficção; a necessidade implícita de investigar a alma secreta do objeto habitual.

rua sorocaba 51, botafogo
rio de janeiro, rj, brazil
+55 21 2267-7654

info@galeriacavalo.com
tuesday to friday 12–7 pm, saturday 1–5 pm
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