Basim Magdy, Pablo Pijnappel, Rafaël Rozendaal, Thora Dolven Balke
A Lesson Loosely Learned
Rio de Janeiro | 06 Junho — 14 Julho 2018
Gee, You’re So Beautiful That It’s Starting to Rain
Oh, Marcia, I want your long blonde beauty
to be taught in high school, so kids will learn that God
lives like music in the skin
and sounds like a sunshine harpsichord.
I want high school report cards
to look like this:
Playing with Gentle Glass Things
A
Computer Magic
A
Writing Letters to Those You Love
A
Finding out about Fish
A
Marcia’s Long Blonde Beauty
A+!
— Richard Brautigan
Felipe R. Pena
Baseado livremente em nenhum fato, acredito que um bom trabalho de arte é como um conselho, um guia sugestivo para o mundo. E por considerar fundamental que essa recomendação seja uma linha de pensamento amarrada frouxamente para deixar passar ambiguidades, imprecisões e falhas, eu queria começar esse texto por uma obra que não foi possível incluir na exposição. A obra em questão é uma espécie de publicação de um poeta norte-americano editada há 5 décadas. ‘Please Plant This Book’, de Richard Brautigan, estampava versos em pacotes de semente. Dentro de uma capa similar a de um disco vinil, uma coleção de oito envelopes soltos de diferentes cores começou a ser distribuída livremente em março de 1968 – no primeiro dia da primavera no hemisfério norte. De um lado, poemas com títulos de flores nativas ou de vegetais comestíveis, no outro, instruções para plantio, no interior, sementes locais e de fácil cultivo. Esses envelopes-poemas-sementes ainda podem ser adquiridos intactos em leilões mesmo após cinquenta primaveras. Nem os versos exaltando jardins, crianças e um futuro esperançoso, nem o pedido de ‘por favor’ na capa puderam evitar que o livro sobrevivesse ao colecionismo quando o próprio autor solicitava o contrário. Cada precioso exemplar preservado é um fracasso que me diverte.
Essas instruções para geração de ores ou alimentos – nutrientes para saciar o corpo e espírito – se correspondem imprevistamente a vídeo-instalação ‘Exercícios Sensuais’ de Pablo Pijnappel, baseada em dois clássicos de auto-ajuda intitulados ‘The Sensuous Woman’ e ‘The Sensuous Man’. O primeiro livro foi coincidentemente também publicado em 1968, e o segundo três anos após, ambos servindo como manuais de atração do sexo oposto. O artista, ao transportar esses conselhos para o contexto do Rio de Janeiro contemporâneo, ridiculariza as posições conservadoras presentes nesses guias de comportamento para uma sociedade ainda atordoada com as novidades da revolução sexual.
Outras flores aparecem em um tom muito diferente no vídeo do artista Basim Magdy ‘13 essential rules for understanding the world’ . Nessa espécie de paródia pessimista de lmes educativos, rostos expressivos rabiscados em tulipas apresentam alguns mandamentos cínicos que tratam de questões como isolamento, abandono e insigni cânia da humanidade. O absurdo presente nessa coleção misantropa de regras torna-as angustiantemente cômicas.
Rafaël Rozendaal formula desde 2013 uma série de trabalhos ‘Haiku’ que considera obras não materiais. São pinturas monocromáticas na parede dispostas como páginas de um livro aberto, com frases que partem da lógica dos tradicionais poemas japoneses de três linhas para descrever situações banais da era digital, como a saturação de informação, anseios hiper-capitalistas, e frustrações do mundo atual. É curioso também pensar que os curtos poemas de Richard Brautigan foram frequentemente comparados a Haiku, tendo o poeta dos envelopes coloridos relatado uma viagem a Tokyo em um dos seus últimos livros.
As fotografias de Thora Dolven Balke exibidas na exposição são o resultado de erros, acidentais ou propositais, de revelação. Elementos como calor, umidade, radiação dos detectores de aeroportos e a pressão dos dedos da artista interferem na reação química das polaróides e deformam as imagens. Essa aplicação imperfeita da técnica produz cenas enigmáticas que resgatam a propriedade líquida da fotografia. Os mergulhos e banheiros úmidos retratados não são tema por acaso, mas parte fundamental da materialização das cenas. No desrespeito a certas ordens ou na relação íntima com regras, os trabalhos dos artistas convidados foram reunidos com a auto-educação em mente. Uma lição de vida não literal, anotada e borrada na palma da mão.
BIO
Basim Magdy (Assiut, Egito, 1977) é um artista baseado entre Cairo, Egito e Basel, Suíça. Seu trabalho faz parte de importantes coleções incluido MoMA – Museum of Modern Art, New York e Guggenheim Museum, New York e já foi exposto em inúmeras exposições individuais e coletivas incluindo “Ocean of Images: New Photography 2015”, MoMA – Museum of Modern Art, New York; A “13ª Bienal de Istambul”, Turquia, 2013;; “the Sharjah Biennial 11”, UAE, 2013; “La Triennale”, Palais de Tokyo, Paris, 2012 and Transmediale, Haus der Kulturen der Welt, Berlin, 2012. Ele foi nomeado para a segunda edição do Future Geration Art Prize, Pinchuk Art Centre em 2012 e o vencedor do Abraaj Art Prize, Dubai e the New:Vision Award, CPH:DOX Film Festival, Copenhagen in 2014. Magdy é o ganhador do prêmio Artista do Ano do Deutsche Bank de 2016.
O brasileiro Pablo Pijnappel (Paris, França, 1979) cresceu entre a Europa e o Rio de Janeiro. Formado em Amsterdã na Rietveld e na Rijksakademie, hoje vive e trabalha entre Rio e Berlim. Já participou de inúmeras exposições coletivas e individuais em diversos espaços nas principais capitais da Europa e dos EUA, com destaque para o Centre Pompidou, Whitechapel Gallery, Konsthall Malmö, Artists Space, LACE, entre outros. Também fez parte da XXX Bienal de São Paulo.
Rafaël Rozendaal (Amsterdam, Holanda, 1980) é um artista holandês-brasileiro que atualmente vive e trabalha em Nova York. Já colaborou com instituições como Centre Pompidou, Kunstverein Frankfurt, TSCA Gallery Tokyo, Seoul Art Fair, Media Art Institute, Kunsthal Rotterdam, Hammer Museum LA e Stedelijk Museum Amsterdam. Seu trabalho artístico abrange websites, instalações e desenhos. Ele realiza turnês de palestras ao redor do mundo e é um autor. Sua atividade principal consiste em suas obras digitais, cada uma com seu próprio domínio, com cerca de 30 milhões de visitas por ano.
Thora Dolven Balke (Oslo, Noruega, 1982) é uma artista norueguesa que vive entre Oslo e Rio de Janeiro. O seu trabalho fez parte de exposições como “The Collectors” nos Pavilhões Dinamarquês e Nórdico da 53ª Bienal de Veneza, 2009; “Lights On – Norwegian Contemporary Art”, Museu Astrup Fearnley Oslo, 2008; a Bienal de Jafre, Catalunha, Espanha, 2009. Dolven Balke fez parte da dupla de curadoras do Festival Internacional de Arte de Lofoten, a Bienal LIAF em 2011, e co-financiou e programou o espaço REKORD dirigido por artistas em Oslo de 2006 a 2010. Exposições recentes incluem; They, Them, Galerie Drei, Colônia, 2015; Kapital.FM, Wilkinson Gallery, Londres, 2015; Innland, Centre Création Contemporaine Olivier Debré, França, 2017; The Young Lions, Museu Preus Photographic, Oslo, 2017 e exposição individual “Tudo o que respira, conspira” na UKS Young. Artists Society, Oslo, 2017.